Viver é Eternizar
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh5j1IG71xtgwEPqh70o5nN1ze2ntcvqxdfmYB4tSe4Y1Cla2kJQiVt4fED8h6m9uXIImBqeRXH0gdANY7k_Uik8EWpZdQYWWoR9vfcbJ55v3IXebvgftKjZCKbnIZztxQi7VNMgIWA9Dc/s1600/parmenides.png)
“Não te trago ouro
Porque ele não entra no céu
E nenhuma riqueza deste mundo
Não te trago flores
Porque elas secam e caem ao chão
Te trago os meus versos simples
Mas que fiz de coração“
Porque ele não entra no céu
E nenhuma riqueza deste mundo
Não te trago flores
Porque elas secam e caem ao chão
Te trago os meus versos simples
Mas que fiz de coração“
(Chimarruts)
PARMÊNIDES
“O ser é e o não-ser não é”
"Pois pensar e ser é o mesmo"
“Não importa por onde eu comecei, pois para lá eu voltarei sempre.”
Acrone
estava defronte ao espelho que ganhara de Heráclito há cinquenta anos. Ficara
viúva e agora estava só, novamente só. O espelho é uma lembrança muito forte,
pois foi o primeiro presente que ganhara de Heráclito, justamente no dia em que
aceitou o seu cortejo. Cinquenta anos se passaram e o espelho permanecia com
ela, ao contrário dos ramalhetes de flores que Heráclito trazia em suas
inúmeras e primordiais tentativas de namoro; e do próprio Heráclito que há um
tempo se fora. As lembranças também continuavam presentes a ponto de Acrone ter
vivas as palavras de Heráclito de que o espelho era para que ela lembrasse
todos os dias da existência da beleza… e… da feiúra, pensava agora.
![Resultado de imagem para imagem de idoso no espelho](https://artigosecronicas.files.wordpress.com/2010/05/imagem-no-espelho.jpg)
Nem
percebeu, em sua ira, que postado em frente à porta aberta estava um homem de
mais ou menos setenta anos. Ao virar-se levou um susto:
-
Quem é você? – Quis saber Acrone
Avançando dois passos, o homem lhe falou:
- Um
velho amigo...Não me reconhece?
Acrone levou a mão ao peito ao reconhecer o homem que estava à sua
frente, espantada com a aparição, mal conseguia balbuciar palavra alguma.
-
Parmênides!?
Como
era possível Parmênides estar ali se, segundo lhe informaram, havia morrido a
mais de cinquenta anos na Macedônia? Depois de muito tempo estava à frente de
Acrone seu primeiro e grande amor. O mundo dera um giro e voltara ao ponto
inicial. Como pode? – pensou.
-
Por onde andou? Por que sumiu? Por que me abandonou? – Conseguiu finalmente
falar Acrone, fazendo com que as perguntas saíssem automaticamente.
- Calma –
pediu Permênides – Eu explicarei o que aconteceu! – Falou, pegando nas mãos de
Acrone.
Parmênides recuperou o fôlego, olhou nos olhos de Acrone e começou a
esclarecer sobre seu sumiço por tantos anos.
-
Assim que cheguei na Macedônia, caí preso, confundido com um inimigo do reino.
Fiquei incomunicável por dois anos, por isso não consegui contato contigo.
Depois que me libertaram, ao se darem conta do engano, voltei, mas soube que
você não me esperou, já se encontrava casada com Heráclito…
Acrone esbouçou interromper Parmênides, mas ele fez um gesto com as mãos
de que iria continuar falando:
- Não
a culpo, Acrone, afinal, eu havia desaparecido. Você precisava seguir em
frente. Então, resolvi não aparecer novamente, deixar sua vida fluir, como
dizia Heráclito.
- A
informação que tínhamos é de que você havia morrido – esclareceu Acrone –
prestei luto por um ano inteiro. Se eu soubesse, haveria de te esperar.
Então Parmênides e Acrone não seguraram seus impulsos, se abraçaram e,
quando menos esperavam, os lábios se encontraram mais de cinquenta anos depois
do primeiro beijo. A textura dos lábios se modificara, mas o sabor permanecia o
mesmo.
-
Agora que estou velha – falou Acrone, depois que os lábios se desgrudaram –
tenho a oportunidade de gozar da sua companhia. Parece injusto, já que temos
tão pouco tempo!
- O
tempo, como tudo que existe, é eterno e imutável – Filosofou Parmênides – Tal
como permaneceu eterno e imutável o nosso amor.
Então Acrone foi até o espelho que ganhara de Heráclito e novamente o
virou, desta vez para si.
-
Quando Heráclito me deu este espelho eu conseguia ver através dele alguém jovem
e bela… - Lamentou Acrone, mostrando a Parmênides que ela não era mais a mesma
de antigamente.
- E
o que vê agora? – Interrompeu Parmênides.
-
Flacidez, rugas… Como Heráclito dizia: tudo muda, tudo se transforma…
![Resultado de imagem para imagem de idoso no espelho](https://st.depositphotos.com/1983457/2241/i/950/depositphotos_22418471-Mirror-image.jpg)
-
Mas o espelho me diz o contrário… - Falou ironicamente Acrone, um tanto
contrariada com a imagem refletida.
-
Olhe novamente, encare-o – Falou Parmênides segurando os ombros de Acrone – Não
observe a imagem com olhos da face, eles nos enganam… Observe com os olhos da
alma. Assim, chegará a conclusão de que a Acrone jovem e a Acrone de hoje são
exatamente a mesma pessoa. As opiniões, a maturidade, não transformaram este
ser chamado Acrone numa outra pessoa, pois a essência permanece inalterada
desde seu nascimento. Olhe sempre o mundo com os olhos da alma… Ponha alma nas
coisas para que façam sentido, senão sua vida não será mais que um truque de
mágica. Não há sentido em confiar nos sentidos! – Falou Parmênides sem se
conter em fazer o trocadilho – Se você der importância ao que é transitório,
como as rugas, por exemplo, realmente não poderá ser feliz, porque estará
ressaltando a finitude, a morte; se por outro lado, der mais importância ao que
está dentro de você, o infinito será revelado por sua alma e a fará feliz. Não
dê importância ao existencial, que se apresenta e some, dê importância ao
essencial e se tornará eterna.
![Resultado de imagem para imagem de casal de idosos](https://www.redealeluia.com.br/wp-content/uploads/2014/04/bem_estar_casal_idoso.jpg)
LIÇÕES DO MESTRE:
Parmênides contrapôs Heráclito em sua visão mobilista, afirmando que as
transformações não passam de enganos dos sentidos, pois o ser é eterno enquanto
ente existente, mesmo que seja finito em si mesmo, pois ele começa e termina
exatamente com os mesmos atributos, ou seja, cada ser é o que é, sem nada ser
acrescentado ou modificado, pois do contrário deixa de ser o que é e passa a
ser outra coisa. Em outras palavras, afirma que não podemos confiar nos
sentidos. Não importa quantas vezes uma pessoa entra num mesmo rio, ambos serão
sempre os mesmos, pois rio é rio e pessoa é pessoa e sempre assim serão, os
sentimentos brotados em cada banho não passam de momentos passageiros.
Se levarmos esse pensamento para a questão do ser humano, veremos que
Parmênides valoriza a essência, o interior, a introspecção e o pensamento. Se,
por exemplo, colocarmos lado a lado um indígena e um asiático e analisarmos à
luz da filosofia de Heráclito, diremos que ali estão um indígena e um asiático,
ressaltando as diferenças, um essencialmente indígena, outro essencialmente
asiático. Se a mesma análise for feita à luz da filosofia de Parmênides diremos
que estamos diante de dois seres humanos, ressaltando o que os une, a sua
essência primordial, e não o que os divide.
Assim, cultivar a essência e se importar com as coisas duráveis é a
grande lição do mestre Parmênides para nossa vida. Que seja verdadeiro cada
amor, cada ato, cada beijo, cada toque... Não há espaço para momentos efêmeros
e desprovidos de sentidos. Ensina ainda que somos todos iguais e, se assim
somos, temos a capacidade de ser o que o outro é, sem deixar que nos façam
diminuídos ou derrotados. Assim, cada vez que o abatimento se aproximar, saiba
que a força está em seu interior e é ali que estará a solução, por mais ou
menos rugas que o espelho lhe mostre.
Na
Pista de Parmênides
O
Dj Parmênides traz à pista um momento de introspecção e monotonia.
Pode
começar com “Por enquanto” da Legião Urbana que, embora traga em seu título a
volatilidade das coisas passageiras e faça um jogo constante entre o efêmero e
o eterno, termina por afirmar: “estamos indo de volta pra casa”, pois como
afirma Parmênides, tudo volta ao início.
Segue
tocando “Flores” do Titãs, pois mesmo que morram todas as flores naturais, como
afirma a música, a ideia fica, seguindo a máxima de Parmênides de que “pensar e
ser são o mesmo” e, como diz a música, “as flores de plástico não morrem”.
Também
tem espaço para “Planeta Água” de Guilherme Arantes ao afirmar: “Águas que
movem moinhos são as mesmas águas que encharcam o chão e sempre voltam humildes
pro fundo da terra”.
O
Dj também está atento a um romance que pode pintar na pista, então pode rolar a
Sandy cantando: “por ser imortal, não morre no final...” ou “Me leva”, do Tim
Maia que diz “com você no verão, primavera, outono ou inverno, nosso caso de
amor tem sabor de sonho eterno”.
Ainda
rola Cazuza quando fala “amor da minha vida, daqui até a eternidade”.
O
som da Banda Catedral será o mais executado com músicas como “Eu amo mais você
do que eu” que traz frases do tipo “a verdade é absurda no plural” e “penso
infinitamente sem parar, a verdade é transparente no mirar da tua retina, minha
menina”; ou como a música “Atemporal” que afirma: “Eterno enquanto dure tem um
final, mas meu amor por você é atemporal”, contrapondo-se a famosa frase
heraclitiana de Fernando Pessoa sobre o amor ao dizer ser eterno enquanto dura.
A
playlist com as músicas internacionais contém My Way (Eu planejei cada caminho
do mapa, cada passo, cuidadosamente, no correr do atalho) e One, do U2,
merecendo um bis com a versão de Jonnhy Cash.
Nesta
pista o som é o da eternidade, que ressalta os sentimentos duradouros, levando-nos
a refletir sobre a eternidade e dançar ao rodopio de uma sensação nostálgica
que de repente nos acomete: Somos tão jovens...
Gostei imensamente da sua narrativa. Já faz alguns dias que estou com essa frase rondando meus pensamentos “Não importa por onde eu comecei, pois para lá eu voltarei sempre". São muitos questionamentos, muitas dúvidas ao adentrar nesse adorável mundo filosófico. Parmênides em contraposição ao pensamento de Heráclito e eu no meio desses dois gigantes em busca de respostas. Foi assim que cheguei aqui e saio agradecida pela sua análise. A palavra essência primordial parece ser a grande chave desse portal, pois se a constante mutação é um fato, e se pensarmos que para tudo tem um oposto, então o imutável passa existir.
ResponderExcluir